sexta-feira, 26 de abril de 2013

NOIVADO DA MINHA PRIMA




Esta história se passou no âmbito familiar.
Todos nós temos um tio preferido. Aquele com o qual temos mais afinidade.
No meu caso, o tio que eu mais gostava era o tio João. Não significa que eu não gostasse dos outros, mas o tio João era especial. Além de tio, ele também era o meu padrinho de batismo. Irmão caçula do meu pai, desde que me conheço por gente, eles sempre foram sócios em um estabelecimento comercial. Estávamos muito próximos o tempo todo. Quando criança, era ele que, toda tarde, me ajudava a fazer a tarefa da escola. Foi ele que me ensinou a escrever o meu nome.  Alem de tudo isso, era um ótimo desenhista e um fantástico contador de histórias.  Adorava os desenhos que ele fazia, ilustrando as histórias que contava.
O meu tio teve cinco filhos e, somando aos três filhos do meu pai, éramos oito primos vivendo praticamente juntos durante o dia todo no bar de propriedade da família.  Lá passávamos o dia todo e íamos pra casa apenas na hora de dormir. Assim, crescemos quase como irmãos.
O tempo passou, todos já crescidos, começamos a namorar. Um dia, minha prima mais velha resolveu ficar noiva.
Meus tios resolveram comemorar o noivado, numa reunião íntima com a presença apenas dos parentes mais próximos, tanto do lado da noiva, quanto do noivo. A “festinha” foi programada para a casa desse meu tio.
Minha tia Maria, mulher do tio João, estava bastante preocupada em receber os convidados, pois o noivo pertencia a uma tradicional família de uma pequena cidade da região.  Parece-me que eles eram parentes de um governador de estado daquela época.  Tanto que, no dia do casamento, esse político passou na casa do meu tio para cumprimentar a todos, já que à noite, na hora da cerimônia, ele não poderia estar presente.
Posso estar exagerando, mas tenho quase certeza que o meu tio até mandou pintar a casa para receber convidados tão ilustres. 
No grande dia do noivado, chegamos à recepção por volta das oito da noite vestimenta caprichada, pois não podíamos fazer feio diante da família do noivo. Meu pai compareceu de terno e gravata, apesar de ser uma festinha íntima na casa do irmão. As mulheres usavam o melhor vestido.  Eu e o namorado da minha irmã nos trajamos socialmente, com paletó, etc. Hoje, reconheço que houve um pouco de exagero por parte de todos, mas, naquele momento, fizemos o que achávamos certo.
O pessoal do lado de lá, apesar de serem pessoas de posse, era gente como a gente.  Mas, depois das apresentações e cumprimentos entre as famílias, de uma forma natural houve uma separação dos grupos na festa. A família do noivo agrupada num canto da casa e a da noiva no outro. No caso da minha família, ficamos na copa, onde havia um móvel tipo cristaleira, um sofá, algumas cadeiras e uma mesa com uma bela toalha de renda branca, decorada com um bolo salgado ao centro.  Este bolo tinha uma cobertura de maionese, enfeitado com tomates vermelhos cortados em forma de cestinhos.
A festa rolava muito animada, com as famílias separadas.  Eles lá e nós cá.
Num certo momento, o tio João aparece na copa, com uma garrafa de champanhe, me fazendo provocações.  Foi quando ele me disse:
- Você está muito desanimado!  Vamos agitar, Valdo! Era assim que ele me chamava.
Eu continuei sentado no sofá, bem quietinho.
Em seguida, ele colocou a garrafa em minhas mãos e pediu para eu abri-la.
          Então, eu disse:
- Tio, abra o senhor, que tem mais prática. 
Que nada!  Ele queria me deixar mais a vontade, pois percebeu que eu estava mesmo meio sem ambiente na festa.  Estava meio murcho, sem graça.
Como eu não tinha escolha, tirei o papel laminado que envolve a boca da garrafa de espumante, e em seguida comecei a torcer o arame que prende a rolha.  De repente, BUUUUUMMMMMM.  Uma forte explosão e o ambiente ficou escuro.  Estávamos sem luz.
Foi quando senti a espuma da champanhe gelada escorrendo sobre as minhas mãos.  Precisei afastar a garrafa rapidamente, para não molhar a minha roupa, enquanto o liquido derramava no chão da copa.
Estava atônito.  Ainda não tinha percebido o que tinha acontecido.  A pressão no interior da garrafa era tão grande, que a rolha explodiu antes mesmo de eu conseguir tirar totalmente o arame de proteção.
E, com uma pontaria digna de Guilherme Tell, a rolha foi direta em direção à lâmpada fluorescente instalada no teto do recinto que explodiu despejando os seus “cacos” sobre aquele delicioso bolo salgado que seria servido mais tarde.
Tia Maria, coitada, quase teve um chilique.  Como uma coisa dessas poderia ter acontecido justamente naquele dia diante de convidados tão ilustres?
Pois é.  Aconteceu!  E tinha que ser comigo!
Em seguida, foi providenciada uma nova lâmpada para iluminar o ambiente, momento que pude ver o estrago que eu fiz.
Lembro bem da movimentação de umas três senhoras, raspando a cobertura do bolo, removendo os cacos da lâmpada que haviam caído em cima.  Lembro-me também que,  mesmo assim, o que sobrou do bolo foi servido normalmente...  E estava bem gostoso!

OS DOIS IRMÃOS




Durante oito longos anos, trabalhei numa empresa fotográfica no interior do estado de São Paulo, que era dirigida por dois irmãos orientais, descendentes de japoneses.
Essa empresa atuou no mercado durante décadas e chegou a ocupar uma posição de destaque no ramo da fotografia. Começou como uma simples loja de foto, depois expandiu, comercializando fotos infantis a domicilio. Em seguida, se especializou em coberturas de bailes de debutantes e formaturas, onde conseguiu ser a maior do ramo. Nos últimos anos da sua existência, atuou no varejo fotográfico chegando a possuir uma rede de mais de 50 lojas. Depois, a empresa foi vendida, os irmãos se separaram e passaram atuar em outros ramos de atividade.  A minha história nessa empresa, começou na fase final, ou seja, quando ela passou a atuar no varejo fotográfico.  Fui gerente de filiais, atuando em várias cidades diferentes.
Não vou revelar aqui o nome da empresa, nem dos proprietários, porque não vivi as histórias que vou contar, apenas estou repassando porque as achei muito curiosas e engraçadas.  Elas aconteceram num período que eu ainda não estava na empresa, em departamentos diferentes daquele que atuei.
Então, vamos lá.
Os irmãos eram pessoas bem diferentes.  Um baixinho, bem moderno, com hábitos ocidentais. Só que tinha uma certa dificuldade de se expressar em português, pois fora criado por família japonesa bem tradicional.  Pelo jeitão dele, era mais brasileiro do que japonês.
O outro irmão era bem diferente, bem conservador.  Alto, magro, com os cabelos com fios longos e lisos, assentados com algum creme para não caírem na testa.
O pessoal mais antigo de firma costumava contar passagens do relacionamento dos dois.  Dos desentendimentos entre eles, das brigas, que eram cômicas aos olhos dos outros.  As discussões eram impagáveis. Inclusive percebi que o pessoal gostava de imitá-los enquanto contavam suas histórias.
A empresa ser enorme, possuía uma frota de mais de 200 veículos, entre carros, ônibus, micro-ônibus, furgões, caminhões e até dois aviões,
Mesmo com toda essa grandiosidade, nos finais de ano, quando a quantidade de formaturas ou bailes de debutantes era grande, os dois irmãos e sócios  empunhavam os equipamentos fotográficos e acompanhavam as equipes, ajudando a fotografar e  a pilotar as viaturas.  Eles encaravam qualquer trabalho que aparecesse, se igualando a qualquer funcionário da empresa.  Por isso, eram muito queridos.
Das histórias que me contaram dos dois irmãos, vou pinçar três, e juntá-las como se tivessem acontecido numa sequência.  Mas, na verdade, elas aconteceram em épocas e locais separados.  Os dois irmãos prepararam uma equipe de fotógrafos, para cobrir um baile de debutantes em outra cidade.  Naquele momento, como não havia nenhum veículo grande disponível, eles resolveram dividir a equipe em dois carros: um Ford Galaxie e uma Chevrolet Caravan.
E caíram na estrada. O irmão mais velho na frente, e o mais novo no carro de trás.
Depois de algumas horas de viagem, já depois do almoço, o carro da frente sai pelo acostamento, invade uma área plantada às margens da rodovia e levanta aquele poeirão...
O irmão que seguia no carro de trás, freou bruscamente, estacionou o carro e correu até o veiculo que havia saído da estrada.
Preocupado com os ocupantes do veículo, percebeu que todos estavam bem, e o carro não estava avariado. Foi só um grande susto. Todo nervoso, perguntou para o irmão, o que havia acontecido.  A resposta foi hilária:  EU ME DISTRAÍ COM O  MERANCIAL (melancial:  plantação de melancias). Japonês, às vezes, troca L por R.
Passado o susto, seguiram viagem.
Chegando ao destino, seguiram para um hotel, descansaram um pouco, tomaram um banho e se vestiram para o trabalho.  Por volta das 21hs, dirigiram-se ao clube local, onde seria realizado o Baile das Debutantes.
Todos elegantemente vestidos de smoking preto, fizeram a checagem de praxe nos equipamentos e se posicionaram em locais estratégicos do clube, para  fotografar a chegada das debutantes com as respectivas famílias.
O pessoal começou a aparecer, e de longe dava para ver os flashes disparando freneticamente.  Era a equipe toda na maior “pauleira” fotografando as meninas, familiares e convidados.
Chegado o momento da apresentação das debutantes.  O mestre de cerimônias anunciava o nome, e a menina-moça, toda garbosa, desfilava pelo salão do clube, apinhado de gente.  Os fotógrafos, cada um na sua posição, registravam as melhores poses das moçoilas sorridentes.
E os irmãos fotografando também, na maior empolgação, como se fossem debutantes na profissão.
Num dado momento, o irmão mais alto, dos cabelos lisos, que também era o mais velho, levou um escorregão e caiu de bunda no chão. Todos levaram um susto, pois ele já não era nenhum jovem.  Já era um senhor bem maduro.
O interessante é que ele não se abalou.  De smoking, com o equipamento fotográfico no pescoço, ainda sentado no piso do salão, enfiou a mão no bolso traseiro da calça, tirou um pente, e deu aquela ajeitada no cabelo.  Só depois se levantou, e continuou fotografando com a maior tranquilidade, como se nada tivesse acontecido.  No salão, em todos os cantos, era possível notar as pessoas rindo da cena.
A festa continuou até altas horas da madrugada.
Quando o trabalho foi encerrado, o pessoal carregou o equipamento nos carros e foi tomar um lanche.  Ao invés de dormir na cidade, os dois irmãos resolveram pegar a estrada naquele mesmo instante. Deviam estar com saudade de casa.
Saindo na estrada, o irmão mais novo resolveu pisar um pouco mais no acelerador e deixou o irmão mais velho pra trás.
Algum tempo depois, já bem separados pela distância, perderam o contato um com o outro.
De madrugada, quase amanhecendo o dia, a viagem segue. O patrão mais velho dirigindo e os funcionários desmaiados dentro do carro, dormindo profundamente.
De repente, o carro freia bruscamente. Ele joga o veículo no acostamento, puxa o freio de mão, abre a porta da Caravan e sai correndo pela pista.
            Os meninos que dormiam ao lado e no banco de trás do carro, sem saber o que estava acontecendo, saíram do carro no maior desespero, um passando por cima do outro, se atropelando...  E correram atrás do patrão, sem saber o que realmente estava acontecendo.  Uns acharam até que o carro ia explodir...
- O que foi, patrão?  Perguntaram.
E ele, ainda correndo:
- Resolvi correr um pouco, para espantar o sono.
É mole?  Imaginaram a cena?  Os moleques queriam esganar o patrão.

JÁ REBOBINOU?



Início dos anos 90, no Cine Foto Star em São José do Rio Preto, aconteceu uma cena curiosa.
Nessa época, eu atuava como gerente dessa empresa e contava com um quadro de funcionários de 12 pessoas mais ou menos.
A nossa equipe contava com pessoal do laboratório fotográfico, da área administrativa e os atendentes de balcão.
Na equipe de atendentes, trabalhava Sofia (nome fictício).  Era uma morena magra, alta, esguia e bastante cabeluda.  Cabelos crespos, armados... Uma das características dela, que chamava mais atenção, era a sua forma de olhar.  Olhar fixo, penetrante.
Dentre os produtos e serviços que oferecíamos na época, o que girava um movimento maior, era revelação de filmes e ampliação de fotografias.  No início de semana, principalmente, era uma loucura o volume de serviço que tínhamos.
A maioria dos clientes não sabia operar seus equipamentos e preferia trazer as câmaras fotográficas até a loja, para que nós tirássemos os filmes para revelar.  Eles não sentiam segurança em realizar esta tarefa e sempre tinham uma história para contar de fotos importantes que foram perdidas, devido a um erro na hora de tirar o filme da máquina.
A maioria dos acidentes acontecia, porque o fotógrafo amador esquecia de rebobinar o filme antes de abrir a tampa da câmara. Rebobinar era guardar o filme dentro da própria embalagem original.  As tampas eram abertas com o filme exposto à luz e todas as fotografias eram perdidas, veladas (queimadas).
Seguindo essa rotina, numa bela segunda-feira de bastante movimento, adentra a loja, um cliente, aparentando idade entre 50 e 60 anos, com sua câmara na mão.
Esse cliente foi atendido pela Sofia, aquela do olhar penetrante.  Depois dos cumprimentos de praxe, ele solicitou para que ela tirasse o filme da máquina e encaminhasse para revelação.
De pronto, ela pegou a câmara e, olhando fixamente nos olhos do cliente, perguntou: 
- O senhor já rebobinou?
Ele leva um susto, recua, retoma a respiração e retruca:
- O que é isso menina!  Me respeite!  Você está pensando que eu sou o quê?   
Pronto! A confusão já estava armada.  Com a loja lotada de clientes, aquilo virou um circo.
Sofia, não entendendo a reação do cliente, tenta explicar a pergunta, mas ele, profundamente ofendido, não conseguia ouvir o que ela queria dizer.
Foi necessário a presença de outra vendedora, com olhar menos insinuante, para desfazer o mal entendido, apaziguar os ânimos e encaminhar o filme do cliente para a revelação.
O que será que ele entendeu por “O SENHOR JÁ REBOBINOU?”
Êta mente suja!!!!

OS EMBALOS DE SÁBADO A NOITE



No ano de 1978, trabalhava por conta própria.  Fotografava crianças de casa em casa, fazendo álbuns e posters.  Nesta ocasião, morava em Lins e trabalhava em Santos, cidade do litoral paulista.
Devido à distância, trabalhava duas semanas seguidas e só retornava a casa a cada 15 dias.  Assim, passava um final de semana em casa e outro fora.
Num destes finais de semana que passei em Santos, resolvi assistir o filme que era a sensação do momento: “Os embalos de sábado à noite”, com John Travolta.  Vivíamos a época das discotecas.
Dos cinemas que exibiam o filme na época, escolhi o Cine Roxy, localizado na Avenida Ana Costa.  Principalmente, pela facilidade de estacionamento.
Acontece que quando cheguei ao cinema, o filme já havia começado e já estava quase na metade da exibição, segundo informação do porteiro. Entrei na fila que já se formava e comprei o meu ingresso.
Guardei o ingresso na carteira e me dirigi a uma lanchonete localizada nas imediações.
Como ia demorar pelo menos uma hora para iniciar a próxima sessão, resolvi tomar um lanche, pois estava com fome.
Depois do lanche, matei o resto do tempo admirando os produtos de uma loja de artigos fotográficos, ali ao lado do cinema. Faltando poucos minutos para o início da minha sessão, me encaminhei para o cinema.
Chegando ao Cine Roxy, me dirigi à porta de entrada da sala de projeção.  Tirei o Ticket da carteira e entreguei ao porteiro do cinema. Ele me olhou com espanto e ficou me encarando.  Sem entender o porquê daquela encarada, fui entrando, mas intrigado com a reação do porteiro.
Escolhi um bom lugar e curti o filme embalado pela trilha sonora dos Bee Gees.
O filme terminou perto da meia noite. Fui direto pra cama, pois tinha uma semana inteira de trabalho me aguardando.
Depois de trabalhar duro na segunda-feira, cheguei ao hotel de tarde, tomei banho e fui jantar.
Depois, já no meu quarto, resolvi dar uma organizada na minha carteira.  Até hoje, tenho o hábito de juntar papeis, cartões de visitas, notas fiscais, e outras coisas sem necessidade. Assim, de tempos em tempos, resolvo separar o que realmente interessa e o que sobra vai direto pro lixo.
Enquanto fazia a faxina na minha carteira, olhando papel por papel, uma coisa me chamou a atenção. Na hora, não acreditei no que estava vendo.
No meio daquela papelada toda, encontrei o ticket do Cine Roxy.  Verifiquei a data... era do dia anterior.  Caramba!  Se o ticket estava na minha mão, o que foi então que eu entreguei para o porteiro na hora de adentrar ao cinema?
Botei a cabeça para funcionar e acabei chegando a uma conclusão. Entreguei para o porteiro do cinema, o ticket do pedágio da Rodovia dos Imigrantes que estava guardado no meio daquela papelada toda. Os tickets eram parecidos, tinham praticamente o mesmo tamanho.
Aí, entendi a “encarada” do porteiro.  Ele percebeu que era o ticket errado,  mas não me disse nada. Apenas ficou me olhando, esperando que eu me “tocasse” e entregasse o comprovante correto. Estranha essa atitude dele!
Tive vontade de voltar ao cinema para me desculpar, mas acabei deixando pra lá.
Se querem saber, destruí o ticket e não o utilizei novamente.

segunda-feira, 22 de abril de 2013

DIA DE SUBSTITUTO



A Basílica Menor de Nossa Senhora Aparecida de São José do Rio Preto é uma igreja fantástica. As paredes externas sem pintura, estilo bem rústico, com a parte interna toda pintada e desenhada até o teto. Vitrais, lustres, tudo maravilhoso.  Só conhecendo pessoalmente para avaliar a beleza desse templo religioso.
Foi ali que quase apanhei durante a realização de um casamento.
A noite estava bem fria.
Como de costume, cheguei bem cedo para o compromisso no local. Fui contratado para fotografar um casamento no horário das vinte horas e, às dezenove horas, já estava na capelinha ao lado do altar, fazendo os últimos testes e checagem do equipamento.  Já estava escuro, pois no inverno a noite chega mais rápido.
Nessa noite, eu estava acompanhado de minha colega de trabalho Vanda, que iria me auxiliar no trabalho de iluminação das fotos.
Ainda na capelinha da Basílica, notamos a presença de padrinhos, padre e noivo no altar.  Vimos também que a música já estava sendo executada e uma noiva muito bonita adentrava o templo pelo corredor central.
Percebemos também, que não havia ninguém fotografando nem filmando o evento. Não havia sequer um parente com uma câmara fotográfica, tão comum nos dias de hoje.
Como não tínhamos nada a ver com aquela cerimônia, nos encaminhamos para a porta principal da igreja, onde iríamos aguardar a “nossa” noiva.
De vez em quando, Vanda dava uma olhadinha pra dentro da igreja e lamentava:
-Casamento tão bonito, sem fotógrafo! O que será que aconteceu? 
Pelos trajes dos familiares, dava para notar que se tratava de pessoas com um poder aquisitivo bem razoável. Muito estranho não haver um único fotógrafo ali.  Mas, isso não era problema nosso.
O tempo passava e o casamento já estava mais ou menos na metade, no final do sermão do sacerdote.  De repente, uma senhora muito elegante, de meia idade saiu da igreja e nos abordou.  Pediu pelo amor de Deus que nós a ajudássemos.  Disse que o fotógrafo contratado pela família não apareceu e que o casamento da sobrinha não poderia passar em branco, sem fotos.  Pediu que fôssemos até o altar e fizéssemos algumas fotos sòmente para registrar o acontecimento.
Olhei para a Vanda, meio na dúvida e ela me incentivou. 
-Vamos lá, disse ela.
Ligamos o equipamento e fomos para o altar com os passos bem acelerados, pois o padre já benzia as alianças.
Quando pisei no altar, os noivos já trocavam alianças, mas deu tempo de fotografar sem problemas.
Depois de garantir as fotos das alianças, me dirigi àquela senhora de vermelho que nos chamou.  Ela estava ali, junto aos padrinhos.
Então, perguntei a ela o que ela queria que eu fotografasse, já que a sequência completa para fazer um álbum não seria possível.  O casamento já se encaminhava para o final.
Antes que ela me respondesse, os noivos se beijaram.  Foi quando o primeiro casal de padrinhos começou a me xingar:
-Além de chegar atrasado, você fica perdendo lances do casamento!
Virei pra eles e tentei explicar que eu não era o fotógrafo do casamento.
Do outro lado do altar, a minha auxiliar também ouvia os mais variados tipos de insultos.
Dei um sinal pra ela e, a partir daquele instante, comecei a fotografar tudo como se fosse uma reportagem normal.
Mesmo assim, os insultos prosseguiram.  Até a porta da igreja, quando parei de fotografar.
Então, aquela “madrinha” vestida de vermelho que nos “laçou” ali na porta da igreja, solicitou que acompanhássemos a noiva até a residência, para fotografarmos os presentes, o corte do bolo, os familiares, etc. Desculpei-me, dizendo que não seria possível, visto que a noiva do casamento que eu ia fotografar acabara de chegar.
Ela escreveu o endereço num papel e colocou no bolso do meu paletó.  Disse que iria nos esperar, independente de horário.  Respondi que ia fazer o possível para estar lá.
Bem, a “nossa” noiva chegou, começamos a fotografar e tudo correu bem.  Da igreja, fomos ao salão de festas, onde aconteceu a recepção e terminamos o nosso trabalho quando já passava de meia noite.
Despedimos dos nossos contratantes e seguimos para o endereço do casamento que fotografamos pela metade.
Chegando lá, pudemos nos certificar que a família realmente estava nos esperando.  O bolo ainda não havia sido cortado, a noiva ainda estava vestida, nos aguardando para fazer as fotos com os familiares, presentes, etc.
Arrumaram uma mesa pra gente e nos intimaram a jantar com eles.  Tudo maravilhoso e perfeito.  Porém, tinha uma coisa que me incomodava bastante: os insultos dos padrinhos no altar da igreja.  Fomos chamados de moleques, irresponsáveis, e outras barbaridades.  Com calma, expliquei tudo a eles e a madrinha de vermelho praticamente obrigou a todos os padrinhos a se desculparem perante nós
Tudo bem.  De alguma forma, as ofensas foram reparadas.
No final, mesmo não tendo registrado a primeira metade do casamento na igreja, consegui fazer um álbum bem bonito e consegui um excelente resultado financeiro no evento.



sexta-feira, 19 de abril de 2013

ÁGUA BENTA





            Numa cerimônia de casamento católico,  um dos momentos principais é a benção e a troca de alianças.  Destaco particularmente a religião católica, pois existem algumas religiões que não adotam a troca de alianças como parte da cerimônia.  Para quem fotografa casamento, é uma cena linda, que rende belas fotografias.
Sabendo disso, veja o que aconteceu comigo em Uberlândia, na Igreja Matriz Santa Terezinha.
O casamento acontecia no final da tarde de um sábado.  Igreja cheia, gente bonita, bem vestida.  A noiva, então!... nem se fala!  Maravilhosa, irradiando felicidade.
As portas principais da igreja se abrem, a música começa a tocar e lá vem a noiva com um sorriso de orelha a orelha.
O noivo esfrega as mãos, de tão nervoso que está.
Enfim, o grande momento!  O pai entrega a noiva ao noivo, fazendo-lhe muitas recomendações, para cuidar bem da sua filha, etc....
Os noivos se posicionam no altar e lá vem o padre.
Bom, o sacerdote é um sujeito miúdo, magro, usando barba e aparentando uns trinta e poucos anos.
De início, ele faz uma saudação aos noivos e convidados.  De repente, olha na minha direção e me chama.
Ao pé do meu ouvido, ele diz o seguinte:
- Me faz um favor.  Vá atrás do altar e diga ao Sacristão, que esse som está uma m...
Fiquei espantado com o palavreado do padre, mas obedeci às suas ordens...
Chegando atrás do altar, observei um sujeito sentado numa cadeira, operando um aparelho de som colocado sobre uma mesa. Era o sacristão. Então disse a ele que o padre não estava gostando do som e que alguma providência deveria ser tomada.
Foi quando ele me respondeu:
- Fique tranquilo.  Já sei o que fazer.
Voltei para a minha posição no altar.  O padre, percebendo a minha presença, de volta, testou novamente o microfone, aprovando as providências do Sacristão.
- Agora, sim, som está perfeito!... disse ele.
E começou a cerimônia.
Dava para perceber que o padre estava completamente embriagado. Pela maneira que falava, pelos gestos e pelo cheiro de bebida alcoólica que vinha da sua direção.
E chegou o grande momento da bênção das alianças.
Os noivos, ajoelhados diante do padre e, atrás dele, uma enorme mesa com uma toalha branca, onde estava o baldinho de prata contendo a Água Benta.
O sacerdote, com dificuldade de locomoção, chamou-me de novo.
Pediu que eu pegasse o baldinho de Água Benta para ele. Atendi prontamente.  Peguei o baldinho, que estava sobre a mesa e entreguei nas mãos do padre.  Acontece que ele não pegou o baldinho e, sim o bastão que estava dentro dele. 
Com o bastão nas mãos, abençoou as alianças, os noivos, os padrinhos e até o fotógrafo...
Imagine a cena.  Enquanto eu deveria estar fotografando a Benção das Alianças, estava segurando o baldinho, como se fosse um coroinha, um auxiliar do padre.
Conclusão: perdi o lance!
Não fotografei a cena!
Naquele mesmo dia, já tarde da noite, um amigo cruzou com o padre no banheiro de uma choperia da cidade,  passando muito mal, de tão bêbado que estava.

O TEMPO FECHOU






Eu sempre me considerei pé frio, meio azarado.  Talvez, por ficar pensando nisso, fico atraindo coisas ruins e passando por situações desagradáveis.
A história que vou contar aconteceu em 1985.  Depois que você terminar de ler, me diga.  Eu sou pé frio ou não sou?
No ano citado, eu trabalhava na filial de São José do Rio Preto, da loja Jet Color, com sede em Tupã-SP.
Na ocasião, por motivo de venda o prédio, tivemos que mudar a loja da rua Gal. Glicério para a rua Bernardino de Campos.  Ambas, no calçadão central da cidade.
Essa mudança de endereço fez um bem danado para a filial.  A empresa já estava atuando na cidade há quase dois anos e ainda não havia conseguido deslanchar na praça.  A reinauguração foi muito bem pensada e executada, fazendo com que conseguíssemos em uma semana, o faturamento de um mês normal.  A partir daí, não deixamos a peteca cair e conseguimos fazer com que essa filial fosse a primeira colocada entre 49 lojas, durante 12 meses consecutivos...
Mas - sempre tem um “mas”- a nossa estrutura de funcionários não estava preparada para o movimento alcançado.  Todos nós esperávamos uma melhora no movimento, mas não tanto.  Sendo assim, alguns trabalhos internos, ficaram acumulados por falta de tempo e de mão de obra para executá-los. Os fundos da loja estavam um terror.  Uma montanha de caixas empilhadas, restos da reforma do prédio.  Afinal, havia a necessidade urgente de uma faxina geral naquela parte das nossas instalações.  O setor do atendimento estava impecável.  Tudo limpinho e arrumadinho.
Numa das nossas reuniões de trabalho, combinamos com a equipe toda que, em determinado dia, todos deveriam trazer chinelos, bermudas e camisetas, pois iríamos fazer um mutirão de limpeza nos fundos da loja.
Chegando o tal dia, todos vieram preparados para a faxina que ocorreria depois do expediente.
Perto das dezoito horas, o pessoal começou a abaixar as portas da loja, enquanto outros se dirigiam aos banheiros, para colocar uma roupa apropriada.
Nesse mesmo momento, lá fora o tempo mudava drasticamente.  De um dia super quente, a temperatura caiu, o céu foi ficando escuro e ameaçava o maior temporal.
E o pessoal na maior empolgação e pressa, para terminar o trabalho de limpeza o quanto antes.
Já estava bem escuro lá fora, o temporal cada vez mais ameaçador quando, de repente, acabou a energia elétrica. Esperamos uns dez ou quinze minutos e nada da energia voltar.
Resolvemos então, suspender o trabalho e deixar a faxina para outro dia.  Imagine a dificuldade que foi, todo mundo conseguir localizar a roupa para trocar, na completa escuridão, valendo-se apenas da luz de alguns isqueiros.
Com muita dificuldade, conseguiram se trocar e correr antes que o temporal desabasse.
Fiquei por último. Com os dedos queimados por causa do isqueiro, consegui abrir as portas do fundo, trancar e sair...  Corri até o carro e consegui chegar em casa antes que a chuva me alcançasse.
Aliás, devo dizer que aquela chuva foi um verdadeiro “fiasco”.  Um barulho danado, muito vento, interrupção de energia elétrica e não caiu uma única gota d’água.
Depois de toda essa confusão e do trabalho frustrado,  a energia elétrica voltou por volta das nove e meia da noite.
Nesse mesmo dia e horário, o presidente da nossa empresa, Sr. Eizi Hirano voltava de São Paulo para Tupã no avião da empresa, acompanhados da esposa e dois diretores.
Normalmente, eles aterrissavam em Marília, mas não havia teto.  Consultaram Araçatuba, Bauru, tudo fechado.
- E Rio Preto?  ...
- Acabou de abrir.
- Então, vamos pra Rio Preto, disse o Sr. Eizi.
Chegando a Rio Preto, mais ou menos às dez horas, telefonaram para Tupã e solicitaram um Ford Galaxie da empresa, para buscá-los.  E, como o carro demoraria pelo menos umas duas horas para chegar, resolveram ir ao centro da cidade, jantar num restaurante chinês que eles adoravam..
No caminho do restaurante, ficava a loja que eu trabalhava e eles resolveram passar em frente.
Passando defronte a loja, a surpresa!  Todas as luzes estavam acesas.
Eles bateram às portas (a loja possuía seis portas), chamaram e ninguém respondeu. Não conseguiram entender nada.  Foram jantar.
Umas duas horas depois o carro chegava de Tupã e foi direto ao restaurante para buscá-los.  Antes de viajarem para Tupã, resolveram dar mais uma passadinha pela loja e constataram, mais uma vez, a loja todinha acesa.  Todas as luzes...
O Sr. Eizi viajou para Tupã, preocupadíssimo com o que vira, mas como ninguém sabia onde eu morava, não tinham como comunicar-se comigo
Na mesma madrugada, por volta das três horas, chegava a Rio Preto o furgão trazendo o malote da empresa.  Esse furgão vinha três vezes por semana, trazendo os serviços do laboratório fotográfico, mercadorias e correspondências da matriz para a filial.  O motorista possuía a chave dos fundos da loja, para descarregar o material. Quando chegou, também assustou-se com as luzes acesas.  Imaginou que houvesse ladrões dentro da loja.  Empunhou uma arma que carregava, abriu a porta e entrou chamando pelo nosso nome.
Constatou que não havia ninguém no interior do prédio.  Descarregou toda a encomenda da loja, foi até a caixa de energia e desligou todos os disjuntores.  Com a loja apagada, trancou tudo e foi para o hotel descansar.
No outro dia, no horário de praxe, cheguei para abrir a loja.  Tudo apagado, como achava que havia deixado no dia anterior. Abri a loja e começamos a operar normalmente, até que recebi um telefonema do meu gerente geral, “me passando aquele sabão”.
Ele queria saber, porque eu havia deixado as luzes acesas e eu teimava que não havia feito isso.
Até que o motorista do furgão chegou à loja, contando a mesma história e dizendo que havia sido ele que havia apagado as luzes, quando chegou de madrugada.
Então, a ficha caiu.
Apesar de eu gozar de algum prestígio junto ao meu patrão, a partir daí, em toda reunião de gerentes, ele citava o meu caso quando queria cobrar economia de despesas dos colegas.
-Não vão fazer como o Ari, que fecha a loja e deixa todas as luzes acesas....  Deste jeito a empresa não aguenta!...

E tive que ouvir isso muitas vezes...


CADÊ AS ALIANÇAS?




Desde o início das minhas atividades como fotógrafo, em meados de 1972, a minha especialidade era fotografar crianças. No período de aprendizagem, os meus instrutores me orientaram a fotografar na metragem.
Mas o que é isso?  Os fotógrafos da velha geração sabem bem o que é. Metragem consiste ajustar o foco, calculando a distância entre a câmara e o objetivo a ser fotografado. Desta forma, eu não precisava conferir no visor, se a imagem estava no foco ou não.  Depois de muito treino, fotografar na metragem tornava o trabalho mais ágil e seguro, principalmente nas fotografias em movimento.  E todos hão de convir que movimento é o que não falta às crianças. Já imaginou procurar o foco no visor com crianças correndo?
Nos dias de hoje, na era da foto digital, as câmaras fotográficas possuem foco automático. Assim, o fotógrafo não tem mais a preocupação de ajustar o foco antes do clique final.
Passei quase oito anos fotografando apenas crianças.  A distância máxima que eu utilizava para fazer essas fotos, não passava de dois metros e meio. 
Quando comecei a trabalhar no Foto Euclydes & Gardini, em 1979, precisei reaprender a fotografar.  Ao participar de reportagens de casamentos, formaturas, e outros tipos de eventos sociais, as fotografias eram feitas na sua maioria, a quatro, cinco, seis metros de distância. E eu não tinha muita noção de cálculo para distâncias longas, pois passei o tempo todo fotografando apenas de perto.
Vocês vão entender agora, o porquê da utilidade e facilidade de se fotografar calculando o foco, a invés de focar a imagem no visor da câmara.
No final dos anos 70, quando comecei a fotografar casamentos, era muito grande a presença de padres católicos de origem estrangeira. Principalmente, italianos, alemães e poloneses.  Muitos deles, já com a idade avançada, tinham vivido os horrores da segunda guerra mundial, terminada em 1945.  Eram pessoas com temperamento diferente do nosso e, muitas vezes, bastante esquisitas. Havia a necessidade de se tomar bastante cuidado ao fotografar uma cerimônia conduzida por um padre desses.  De repente, eles podiam reagir de uma forma não esperada e nos colocar numa situação bastante constrangedora.  Não era raro, o padre “passar um pito” no fotógrafo, ou seja, chamar a sua atenção em público por causa de um comportamento que ele achava inadequado.
Na cidade de Buritama-SP, às margens do rio Tietê, vivia um padre com essas características.  Não sei precisar qual a sua nacionalidade.
A particularidade dele era realizar as cerimônias de casamento numa rapidez de fazer inveja ao falecido Ayrton Senna.
O primeiro casamento que fotografei nesta cidade, a cerimônia foi cronometrada em seis minutos e meio, contanto a entrada e a saída da noiva. Um convidado marcou o tempo no relógio e depois, já na festa me contou.
Era muito rápido, mal dava tempo de fotografar o essencial, com as trocas de filmes, que na época tinham apenas doze exposições.
Se o fotógrafo fosse meio lento na troca de filmes, deveria se valer da utilização de duas câmaras carregadas, pois o tempo para fotografar era realmente muito curto.
Depois do susto que passei neste primeiro casamento que fotografei na cidade, a partir do segundo casamento levei reforço comigo. Outro profissional me acompanhou nas reportagens.  Enquanto um fotógrafo fazia o acompanhamento dos detalhes da cerimônia, o outro fazia “vistas fotográficas” da igreja, fotografava padrinhos e convidados.  O segundo fotógrafo também cobria o primeiro na hora de recarregar a câmara.
            Por sorte, ou por competência nossa, os nossos clientes desta cidade aceitaram bem o nosso trabalho e, com frequência, éramos convidados a fotografar os principais eventos sociais ali realizados.
E acabamos nos adaptando ao estilo de trabalho do padre.  A rapidez da cerimônia já não assustava tanto.
Dentre as esquisitices do padre, vou destacar aqui duas delas.  A primeira acontecia sempre quando a cerimônia terminava, os noivos se posicionavam na porta da igreja para receber os cumprimentos dos convidados.  Muitas vezes, presenciei o padre empurrando os últimos convidados para fora da igreja, pressionando as portas nas costas dos mesmos.   A segunda aconteceu quando eu resolvi presentear o padre com um pôster de uma imagem externa da igreja. Ao invés de me agradecer, ele me deu uma bronca dizendo que não era aquele o melhor ângulo e que eu deveria ter fotografado de uma outra posição.  Qualquer pessoa sensata e educada agradeceria o presente, fazendo uma observação do tipo: “Na próxima vez que você fotografar a fachada da nossa igreja, experimente fotografar de tal posição.  Acho que vai ficar melhor” 
Fácil ser gentil, né?  Mas não era o caso do nosso personagem.
Numa bela manhã de sábado, estávamos novamente na cidade para fotografar mais um casamento.  Dia bastante ensolarado, fazendo um calor daqueles. O padre trabalhando com a pressa habitual.
Marcha nupcial entoando, noiva toda sorridente adentrando a nave da igreja. O noivo, esfregando as mãos de tanto nervosismo.
Depois que o pai da noiva a entregou ao noivo, todos se posicionaram no altar e a cerimônia teve início.
Depois de um sermão com meia dúzia de palavras, os noivos prometeram fidelidade um ao outro “até que a morte os separe”. O padre abençoou os nubentes, pediu para que eles se beijassem, cumprimentou-os e deixou o altar.
Os noivos, todos desajeitados se posicionavam para a saída, quando um fato me intrigou.  E as alianças?  Será que foi combinado que não haveria alianças naquele casamento?  Alcancei o noivo pelo braço, e indaguei sobre as alianças.  Foi quando o mesmo me respondeu:
- As alianças estão aqui comigo...O padre não falou nada sobre elas e eu fiquei quieto.
Então, eu disse ao noivo:
- Espere um pouco, que eu vou falar com ele.
Ao lado do altar, havia uma escada que dava acesso à sacristia, que ficava num nível superior.  Era comum, depois de terminados os trabalhos, o padre dirigir-se até a sacristia, tirar a batina e ficar de pé na porta, lá no alto, observando a movimentação do pessoal no salão da igreja.
A figura do cidadão chamava a atenção, pois era um sujeito forte, com uma barriga já saliente, usando barbas compridas e grisalhas.  Estava sempre vestido com uma calça social marrom, com a cintura bem alta, até à boca do estômago, e uma camisa xadrez, de mangas longas com tons de verde e preto, abotoada no colarinho e nos pulsos,.. Deu pra ter uma idéia da figura?
Subi as escadas e cochichei ao ouvido do padre:
- Acho senhor se esqueceu das alianças.
Ele reagiu instintivamente, colocando as mãos no rosto e entrou rapidamente na sacristia para recolocar a batina.
Em menos de um minuto, o padre já estava diante dos noivos, devidamente paramentado.
Pediu as alianças ao noivo.  Fez a benção em silencio e, em seguida, os noivos fizeram a troca das mesmas. Tudo muito rápido.
Sem dizer uma única palavra, sem se desculpar perante os noivos e os presentes, o padre virou as costas e deixou o altar.  Uma vez mais ficou clara a natureza de seu caráter e sua educação.
A cerimônia terminou, com os presentes cochichando e rindo do acontecido.







BONDINHO DO PÃO DE AÇUCAR?




Como vergonha pouca é bobagem na profissão de repórter fotográfico, escute essa!
Para quem nunca trabalhou como fotógrafo de eventos sociais, principalmente no tempo da fotografia analógica (imagens registradas em negativos), cabe aqui uma explicação.
Normalmente, o equipamento básico do fotógrafo social era composto de uma câmara fotográfica que utilizava filme no formato 120, que permitia ampliações de grandes formatos, um bom flash eletrônico, abastecido com uma bateria recarregável e o cabo de sincronismo.  Esse cabo ligava o flash à câmara fotográfica. Possibilitava o disparo do flash, ao mesmo tempo em que a câmara abria o obturador para a captação de luz.  Em suma, o cabo de sincronismo fazia os dois equipamentos funcionarem ao mesmo tempo.  Flash e máquina.
Muito bem.  Aconteceu na Basílica Nossa Senhora Aparecida, em São José do Rio Preto, essa passagem da minha vida profissional.  Novamente, uma reportagem de casamento, onde tudo corria normalmente até o momento do acontecido.
Nessa igreja, no final da cerimônia, o padre parabenizava os noivos que, em seguida, se beijavam.  Na sequência, os noivos partiam para os cumprimentos dos padrinhos que estavam posicionados nas laterais do altar. De início, a noiva se dirigia para o lado onde estavam os pais e padrinhos do noivo, ao mesmo tempo em que o noivo fazia o inverso. Resumindo, os noivos começavam cumprimentando os pais e padrinhos do parceiro.
Eles iniciavam a sessão de abraços e beijos, pelos sogros, que estavam colocados na entrada do altar, seguindo em direção ao fundo.  Chegando bem em frente ao altar eles se encontravam, beijavam-se e iniciavam os cumprimentos dos seus respectivos padrinhos, do fundo para a entrada, terminando esses afagos com os respectivos pais.
Meio confuso de se explicar, mas acho que deu pra entender.
Na maioria das igrejas católicas, existe uma mesa bem grande no altar, normalmente de mármore.  Nessa mesa, quase sempre coberta por uma linda toalha branca, às vezes rendada, o padre coloca o seu material de trabalho.  Uma Bíblia, o microfone, o baldinho com água benta, etc.
Enquanto os noivos cumprimentavam os padrinhos do lado oposto, eu me posicionei no local onde o sacerdote costuma ficar no momento da cerimônia, já que ele havia cumprimentado os nubentes e se retirado do altar.
Minha intenção era fotografar o encontro dos noivos defronte o altar e o beijo que vinha em seguida.  Aquela cena sempre resultava em fotos muito bonitas.
Coloquei-me na ponta dos pés, por causa da altura da mesa e curvei o corpo para a frente para conseguir um melhor ângulo. Nesse momento, sem perceber, lacei a alça do baldinho de água benta, com o cabo de sincronismo do equipamento que usava.
Quando levantei a câmara até a altura dos olhos para fotografar, foi o momento que senti o peso do baldinho com a água e vi que o mesmo estava enroscado no cabo do flash.
O baldinho, ficou suspenso no ar, parecendo o bondinho do Pão de Açúcar.  Então, com bastante cuidado, fui abaixando a câmara com o objetivo de trazer o baldinho de volta à mesa.  Foi quando percebi que aos poucos e cabo ia se desconectando do plug da câmara.
Infelizmente, não deu tempo.  O baldinho despencou de uma altura de meio metro da base da mesa. Na queda, aconteceu o maior estrago. O baldinho estava cheio de água, com o bastão de metal dentro dele.  Depois de bater na pedra da mesa, rolou para o chão, não me dando tempo de fazer nada, pois estava com as duas mãos ocupadas: a direita segurando a máquina fotográfica e a esquerda segurando o flash.
No momento em que o baldinho bateu no piso da igreja, saiu rolando pela escadaria que dava acesso ao altar.  Existe nesta igreja, um desnível de mais ou menos uns cinco a sete degraus, que separa o publico do altar.
O barulho foi um escândalo, além de ter me molhado todo com a água que saiu do baldinho.
A garotada que estava sentada nas primeiras fileiras dos bancos da igreja fez a maior algazarra com a cena.
Minhas orelhas pegavam fogo e a cor da minha pele devia estar roxa de vergonha.
Mas, o casamento não parou e tive que concluir o meu trabalho.  Continuei fotografando, mesmo com a camisa meio molhada e, às vezes, dava um sorrisinho meio amarelo quando algum casal de padrinhos sorria pra mim...
Estava me esquecendo.  Perdi o lance do beijo dos noivos no fundo do altar.  Não consegui fotografar, infelizmente.
Depois de terminada a cerimônia do casamento, enquanto os noivos recebiam os cumprimentos dos convidados na porta da igreja, voltei ao altar, peguei o baldinho e levei até a sacristia para o padre abastecê-lo de novo.  Aproveitei aquele momento para pedir minhas desculpas pelo acidente. A zeladora da igreja da igreja precisou dar um “trato” no altar, para que o sacerdote tivesse condições de realizar o próximo casamento que aconteceria em seguida.
Aquele foi um dia que eu nunca mais esqueci. Ô, vexame!




ACONTECEU NA BR-153




A BR-153 é uma rodovia federal, que corta o país de norte a sul.  Aqui no estado de São Paulo, ela se inicia no município de Icem, na divisa com Minas Gerais e termina em Ourinhos, na divisa com o Paraná.
Foi nessa rodovia que aconteceram os fatos que vou relatar agora.
Nós tínhamos fechado um contrato para fotografar um casamento na cidade de Icem, na fronteira norte do Estado, cidade que fica distante uns sessenta quilômetros de nossa sede em São José do Rio Preto.
O casamento seria realizado num sábado, sendo o casamento civil no período da manhã e o religioso no período da tarde, às dezoito horas.
Para cumprir esse compromisso, enviei a Icem, meu colega de trabalho chamado Silvio.  Ele viajou de ônibus, logo de manhã, para fotografar o casamento civil no cartório da cidade.  O combinado era que, assim que o casamento terminasse, ele embarcaria de volta para Rio Preto no primeiro ônibus. À tarde, nós dois voltaríamos a Icem, para fotografar o casamento religioso e a recepção.
Tudo corria normalmente, até o momento que recebo um telefonema do Silvio, dizendo que a família solicitou a presença dele no almoço que seria servido em seguida.  Queriam fazer algumas fotos com a família e parentes que vieram de outras cidades.
Sabendo disso, perguntei ao Silvio, se ele se sentia seguro para executar esta tarefa, pois ainda estava na fase de aprendizado como fotógrafo.  Ele conseguia fotografar bem, cenas paradas, onde não houvesse aquela pressa de rotina das reportagens fotográficas.
Perguntei também, se ele havia levado filmes em quantidade suficiente para fotografar o almoço em família e ele me respondeu que se sentia seguro para fotografar, que eu não deveria me preocupar com isso e que tinha levado alguns filmes a mais. Portanto, daria para fotografar o almoço com tranqüilidade.
Diante daquela situação, combinamos o seguinte: terminado o almoço, ele deveria se instalar no único hotel da cidade para descansar e tomar um bom banho.  Eu passaria na casa dele em Rio Preto e pegaria com sua mãe, a roupa que ele usaria no casamento religioso. Combinei também, que sairia mais cedo de Rio Preto, para nos prepararmos com tranqüilidade para o evento da noite.  E assim fizemos.
Ele fotografou o casamento civil seguido do almoço, e depois se instalou no hotel para descansar e aguardar a minha chegada no meio da tarde.
Naquela manhã, trabalhei normalmente na loja da empresa.  Fechei o estabelecimento por volta de meio dia e meio e fui pra casa almoçar.  Antes de tudo isso, telefonei para a mãe do Silvio, pedindo que ela preparasse uma troca de roupa de passeio para eu levar a Icem.
Chegando em casa, tomei um banho, almocei e descansei um pouco.
Por volta das quinze horas, chequei o equipamento que ia usar na reportagem, me despedi de minha esposa e parti.  No caminho, passei na residência do Silvio e peguei um cabide com as trocas de roupa que a mãe dele havia preparado para ele usar no nosso compromisso.
Peguei a estrada.  Estava tranqüilo, pois a viagem normalmente não demora mais do que 45 minutos.  A minha previsão era de chegar bem cedo, para nos prepararmos com bastante calma.
A viagem estava calma, pouco trânsito.  Depois de rodar uns 15 ou 20 minutos, a surpresa.  O transito parou.  Todos os veículos parados sobre a rodovia, com o pisca-alerta ligado. Naquele momento, achei que fosse uma “paradinha” de rotina.  Às vezes, o pessoal da manutenção pára o transito pra fazer algum reparo na pista ou alguma coisa parecida.
Acontece que o tempo de parada foi se prolongando. O pessoal descendo dos carros e caminhões, reunindo-se em rodinhas, batendo papo.   Comecei a ficar preocupado.  De repente, vi uma viatura da Policia Rodoviária Federal estacionada mais adiante.  Fechei o carro e dirigi-me até eles.  Queria saber o que estava acontecendo.
O policial rodoviário me deu uma notícia que eu não gostaria de ouvir.  Um quilômetro adiante, havia acontecido um acidente com um caminhão que levava uma carga de couros.  O caminhão estava tombado no acostamento e a carga estava sendo transferida para outro veículo.  Naquele momento o guincho estava engatando os cabos para destombar o caminhão.  Com aquela movimentação toda de veículos e pessoas, a rodovia precisou ser interditada.
Perguntei então, ao policial rodoviário, se havia uma previsão para o término dos trabalhos, pois tinha um compromisso para logo mais.
O policial me respondeu de forma meio ríspida, que não havia previsão para a desobstrução da rodovia e que todo mundo ali também tinha compromisso, não era só eu.
Comecei a ficar nervoso e as pernas começaram a tremer.  Fiquei pensando no Silvio, sozinho lá em Icem, sem roupa adequada para a cerimônia, sem prática nenhuma para executar um trabalho daquela importância e sem material suficiente para trabalhar.
Começou a chover, uma garoa fininha, que fez com que todos corressem para dentro dos seus veículos. De tão nervoso, eu já nem tinha unhas para roer.  Ia começar a comer dos dedos...
Voltei até onde estavam os policiais,e perguntei a eles se havia alguma outra alternativa, uma estrada rural, mesmo sem pavimentação, que eu pudesse utilizar para desviar daquele trecho de rodovia que estava interrompido.  Resposta negativa.  Eles não conheciam nenhuma rota diferente para me informar.
De repente, um caminhoneiro me sugeriu para eu voltar alguns quilômetros, entrar na pequena cidade de Onda Verde.  Talvez algum morador dessa cidade pudesse me dar alguma informação sobre a tal rota alternativa.
Assim fiz.  Liguei o carro, fiz a meia volta e rumei para Onda Verde. Era realmente uma cidade bem pequena, com uma única rua com estabelecimentos comerciais.

Estacionei o carro, dirigi-me a um bar, onde havia várias pessoas batendo papo.
Expliquei a eles o meu problema e um deles apareceu com uma única solução possível, a Fazenda dos Ingleses.
Essa fazenda era localizada no caminho de uma estrada rural entre os municípios de Onda Verde e Nova Granada.  Se eu conseguisse chegar a Nova Granada, poderia retornar à BR-153, bem à frente do trecho interditado. Só que no meio do caminho, tinha a Fazenda dos Ingleses.  Um dos freqüentadores do bar me disse que eu deveria contar com a sorte.  Se a porteira da fazenda estivesse aberta, tudo bem.  Eu conseguiria passar por dentro da fazenda e chegar ao meu destino. Caso contrário...
A chuva apertou.  Despedi-me do pessoal do bar e coloquei o meu Opalão na estradinha de barro.  A estrada estava péssima, muito barro, muitas poças d’água e muita costela- de- vaca, ondulações na estrada que fazem o carro trepidar  demais.
Depois de muito zigue-zague e escorregões na estrada enlameada, cheguei na Fazenda dos Ingleses. Havia rodado  mais ou menos uns dez quilômetros para chegar lá. Como eu sou um sujeito de “muita sorte”, encontrei a porteira da fazenda fechada.  Não havia uma única alma nas redondezas para me dar alguma informação. 
Chovia muito, chovia demais. 
Nessa altura, eu tinha até medo de olhar para o relógio, cujos ponteiros pareciam hélices de ventilador, de tão rápido que rodavam.  O horário das dezessete horas já havia ficado pra trás há um bom tempo.
Voltei para Onda Verde, pois ali onde eu estava não dava para ir para outro lugar.  Depois de Onda Verde, retornei à BR, numa situação bem mais desfavorável em relação ao início dos fatos.  A fila de veículos havia triplicado e eu tive que me posicionar no fim dessa fila.
Depois de uns algum tempo ali, os veículos começaram a se movimentar.  A rodovia havia sido liberada.  Faltavam uns cinco minutos para as 18hs.
A partir daí, o espírito do Airton Senna incorporou em mim e os meus Anjos da Guarda entraram em cena.  Todos eles.
A quantidade de veículos transitando, era enorme nos dois sentidos.  Corri feito um louco, fiz ultrapassagens impossíveis.
Consegui chegar a Icem às dezoito horas e vinte minutos.
A cidade é pequena.  Num instante, já estava defronte a igreja, que se localizava no meio de uma praça. Já era noite, estava escuro.  De longe, deu pra ver pelas janelas da igreja, a luz das luminárias do cinegrafista que filmava a cerimônia. Comecei a tremer mais ainda, e pensava: - Coitado do Silvio, sozinho lá!
Só esqueci de comentar que, durante o ultimo trajeto da viagem eu já vinha com o equipamento fotográfico colado ao corpo.  A câmara fotográfica pendurada no pescoço e o flash no ombro esquerdo.  Os meus bolsos estavam abastecidos com filmes.  Enfim, já estava pronto para começar a fotografar.
Entrei com o carro na calçada da praça, e estacionei ao lado do carro da noiva.
Invadi a igreja, transpirando feito um louco.  Suava mais do que “moringa nova”.
Observei que o padre ainda fazia o sermão de praxe, e fui logo perguntando pro Silvio.  Em que pé está a cerimônia?  O que já aconteceu?
Então, ele me tranquilizou, dizendo que havia retardado o início da cerimônia o quanto pôde, até que o padre pressionou bastante e o casamento começou sem a minha presença.  E me informou também que os noivos haviam acabado de adentrar a nave da igreja e que ele havia conseguido fotografar a entrada da noiva sem problemas.
Respirei aliviado.  Enchi os pulmões de ar e assumi o comando das operações.  Daí para a frente, tudo normal.  Só alegria e alívio.
Lamentei pelo Silvio, de calças jeans desbotadas, de tênis e uma camisetinha de bater no dia a dia, diante de convidados tão bem vestidos.
No transcorrer da cerimônia, percebi que alguns casais de padrinhos chegaram atrasados e se posicionavam no altar, dando explicações aos demais.  Soube depois, que eles também estavam presos no trânsito da BR. Dessa forma, ficou mais fácil justificar perante os noivos e as respectivas famílias, o meu atraso e explicar como as coisas haviam acontecido.
Situações de sufoco assim, espero  nunca mais passar. Mais uma dessa o meu coração não agüenta.


 A BR-153 é uma rodovia federal, que corta o país de norte a sul.  Aqui no estado de São Paulo, ela se inicia no município de Icem, na divisa com Minas Gerais e termina em Ourinhos, na divisa com o Paraná.
Foi nessa rodovia que aconteceram os fatos que vou relatar agora.
Nós tínhamos fechado um contrato para fotografar um casamento na cidade de Icem, na fronteira norte do Estado, cidade que fica distante uns sessenta quilômetros de nossa sede em São José do Rio Preto.
O casamento seria realizado num sábado, sendo o casamento civil no período da manhã e o religioso no período da tarde, às dezoito horas.
Para cumprir esse compromisso, enviei a Icem, meu colega de trabalho chamado Silvio.  Ele viajou de ônibus, logo de manhã, para fotografar o casamento civil no cartório da cidade.  O combinado era que, assim que o casamento terminasse, ele embarcaria de volta para Rio Preto no primeiro ônibus. À tarde, nós dois voltaríamos a Icem, para fotografar o casamento religioso e a recepção.
Tudo corria normalmente, até o momento que recebo um telefonema do Silvio, dizendo que a família solicitou a presença dele no almoço que seria servido em seguida.  Queriam fazer algumas fotos com a família e parentes que vieram de outras cidades.
Sabendo disso, perguntei ao Silvio, se ele se sentia seguro para executar esta tarefa, pois ainda estava na fase de aprendizado como fotógrafo.  Ele conseguia fotografar bem, cenas paradas, onde não houvesse aquela pressa de rotina das reportagens fotográficas.
Perguntei também, se ele havia levado filmes em quantidade suficiente para fotografar o almoço em família e ele me respondeu que se sentia seguro para fotografar, que eu não deveria me preocupar com isso e que tinha levado alguns filmes a mais. Portanto, daria para fotografar o almoço com tranqüilidade.
Diante daquela situação, combinamos o seguinte: terminado o almoço, ele deveria se instalar no único hotel da cidade para descansar e tomar um bom banho.  Eu passaria na casa dele em Rio Preto e pegaria com sua mãe, a roupa que ele usaria no casamento religioso. Combinei também, que sairia mais cedo de Rio Preto, para nos prepararmos com tranqüilidade para o evento da noite.  E assim fizemos.
Ele fotografou o casamento civil seguido do almoço, e depois se instalou no hotel para descansar e aguardar a minha chegada no meio da tarde.
Naquela manhã, trabalhei normalmente na loja da empresa.  Fechei o estabelecimento por volta de meio dia e meio e fui pra casa almoçar.  Antes de tudo isso, telefonei para a mãe do Silvio, pedindo que ela preparasse uma troca de roupa de passeio para eu levar a Icem.
Chegando em casa, tomei um banho, almocei e descansei um pouco.
Por volta das quinze horas, chequei o equipamento que ia usar na reportagem, me despedi de minha esposa e parti.  No caminho, passei na residência do Silvio e peguei um cabide com as trocas de roupa que a mãe dele havia preparado para ele usar no nosso compromisso.
Peguei a estrada.  Estava tranqüilo, pois a viagem normalmente não demora mais do que 45 minutos.  A minha previsão era de chegar bem cedo, para nos prepararmos com bastante calma.
A viagem estava calma, pouco trânsito.  Depois de rodar uns 15 ou 20 minutos, a surpresa.  O transito parou.  Todos os veículos parados sobre a rodovia, com o pisca-alerta ligado. Naquele momento, achei que fosse uma “paradinha” de rotina.  Às vezes, o pessoal da manutenção pára o transito pra fazer algum reparo na pista ou alguma coisa parecida.
Acontece que o tempo de parada foi se prolongando. O pessoal descendo dos carros e caminhões, reunindo-se em rodinhas, batendo papo.   Comecei a ficar preocupado.  De repente, vi uma viatura da Policia Rodoviária Federal estacionada mais adiante.  Fechei o carro e dirigi-me até eles.  Queria saber o que estava acontecendo.
O policial rodoviário me deu uma notícia que eu não gostaria de ouvir.  Um quilômetro adiante, havia acontecido um acidente com um caminhão que levava uma carga de couros.  O caminhão estava tombado no acostamento e a carga estava sendo transferida para outro veículo.  Naquele momento o guincho estava engatando os cabos para destombar o caminhão.  Com aquela movimentação toda de veículos e pessoas, a rodovia precisou ser interditada.
Perguntei então, ao policial rodoviário, se havia uma previsão para o término dos trabalhos, pois tinha um compromisso para logo mais.
O policial me respondeu de forma meio ríspida, que não havia previsão para a desobstrução da rodovia e que todo mundo ali também tinha compromisso, não era só eu.
Comecei a ficar nervoso e as pernas começaram a tremer.  Fiquei pensando no Silvio, sozinho lá em Icem, sem roupa adequada para a cerimônia, sem prática nenhuma para executar um trabalho daquela importância e sem material suficiente para trabalhar.
Começou a chover, uma garoa fininha, que fez com que todos corressem para dentro dos seus veículos. De tão nervoso, eu já nem tinha unhas para roer.  Ia começar a comer dos dedos...
Voltei até onde estavam os policiais,e perguntei a eles se havia alguma outra alternativa, uma estrada rural, mesmo sem pavimentação, que eu pudesse utilizar para desviar daquele trecho de rodovia que estava interrompido.  Resposta negativa.  Eles não conheciam nenhuma rota diferente para me informar.
De repente, um caminhoneiro me sugeriu para eu voltar alguns quilômetros, entrar na pequena cidade de Onda Verde.  Talvez algum morador dessa cidade pudesse me dar alguma informação sobre a tal rota alternativa.
Assim fiz.  Liguei o carro, fiz a meia volta e rumei para Onda Verde. Era realmente uma cidade bem pequena, com uma única rua com estabelecimentos comerciais.
Estacionei o carro, dirigi-me a um bar, onde havia várias pessoas batendo papo.
Expliquei a eles o meu problema e um deles apareceu com uma única solução possível, a Fazenda dos Ingleses.
Essa fazenda era localizada no caminho de uma estrada rural entre os municípios de Onda Verde e Nova Granada.  Se eu conseguisse chegar a Nova Granada, poderia retornar à BR-153, bem à frente do trecho interditado. Só que no meio do caminho, tinha a Fazenda dos Ingleses.  Um dos freqüentadores do bar me disse que eu deveria contar com a sorte.  Se a porteira da fazenda estivesse aberta, tudo bem.  Eu conseguiria passar por dentro da fazenda e chegar ao meu destino. Caso contrário...
A chuva apertou.  Despedi-me do pessoal do bar e coloquei o meu Opalão na estradinha de barro.  A estrada estava péssima, muito barro, muitas poças d’água e muita costela- de- vaca, ondulações na estrada que fazem o carro trepidar  demais.
Depois de muito zigue-zague e escorregões na estrada enlameada, cheguei na Fazenda dos Ingleses. Havia rodado  mais ou menos uns dez quilômetros para chegar lá. Como eu sou um sujeito de “muita sorte”, encontrei a porteira da fazenda fechada.  Não havia uma única alma nas redondezas para me dar alguma informação. 
Chovia muito, chovia demais. 
Nessa altura, eu tinha até medo de olhar para o relógio, cujos ponteiros pareciam hélices de ventilador, de tão rápido que rodavam.  O horário das dezessete horas já havia ficado pra trás há um bom tempo.
Voltei para Onda Verde, pois ali onde eu estava não dava para ir para outro lugar.  Depois de Onda Verde, retornei à BR, numa situação bem mais desfavorável em relação ao início dos fatos.  A fila de veículos havia triplicado e eu tive que me posicionar no fim dessa fila.
Depois de uns algum tempo ali, os veículos começaram a se movimentar.  A rodovia havia sido liberada.  Faltavam uns cinco minutos para as 18hs.
A partir daí, o espírito do Airton Senna incorporou em mim e os meus Anjos da Guarda entraram em cena.  Todos eles.
A quantidade de veículos transitando, era enorme nos dois sentidos.  Corri feito um louco, fiz ultrapassagens impossíveis.
Consegui chegar a Icem às dezoito horas e vinte minutos.
A cidade é pequena.  Num instante, já estava defronte a igreja, que se localizava no meio de uma praça. Já era noite, estava escuro.  De longe, deu pra ver pelas janelas da igreja, a luz das luminárias do cinegrafista que filmava a cerimônia. Comecei a tremer mais ainda, e pensava: - Coitado do Silvio, sozinho lá!
Só esqueci de comentar que, durante o ultimo trajeto da viagem eu já vinha com o equipamento fotográfico colado ao corpo.  A câmara fotográfica pendurada no pescoço e o flash no ombro esquerdo.  Os meus bolsos estavam abastecidos com filmes.  Enfim, já estava pronto para começar a fotografar.
Entrei com o carro na calçada da praça, e estacionei ao lado do carro da noiva.
Invadi a igreja, transpirando feito um louco.  Suava mais do que “moringa nova”.
Observei que o padre ainda fazia o sermão de praxe, e fui logo perguntando pro Silvio.  Em que pé está a cerimônia?  O que já aconteceu?
Então, ele me tranquilizou, dizendo que havia retardado o início da cerimônia o quanto pôde, até que o padre pressionou bastante e o casamento começou sem a minha presença.  E me informou também que os noivos haviam acabado de adentrar a nave da igreja e que ele havia conseguido fotografar a entrada da noiva sem problemas.
Respirei aliviado.  Enchi os pulmões de ar e assumi o comando das operações.  Daí para a frente, tudo normal.  Só alegria e alívio.
Lamentei pelo Silvio, de calças jeans desbotadas, de tênis e uma camisetinha de bater no dia a dia, diante de convidados tão bem vestidos.
No transcorrer da cerimônia, percebi que alguns casais de padrinhos chegaram atrasados e se posicionavam no altar, dando explicações aos demais.  Soube depois, que eles também estavam presos no trânsito da BR. Dessa forma, ficou mais fácil justificar perante os noivos e as respectivas famílias, o meu atraso e explicar como as coisas haviam acontecido.
Situações de sufoco assim, espero, sinceramente, nunca mais passar. Outra experiência igual a esta o  meu coração não agüenta.