Cidade de Getulina, região Oeste do Estado de São
Paulo, final dos anos 70. Nessa ocasião,
atuava na Igreja Matriz da cidade um padre meio maluco. É, esquisito mesmo. Diziam que havia sido
expulso da cidade de Cafelândia, por envolvimento em atritos com os
freqüentadores da igreja local.
Era uma sexta-feira à noite. Igreja lotada de convidados. No altar, os padrinhos aguardavam
ansiosamente a entrada da noiva.
Nesse dia, eu trabalhei como auxiliar de iluminação
do fotógrafo principal, o Euclydes. Ao
nosso lado trabalhava uma dupla de cinegrafistas. Um japonês empunhando uma câmara de filmagem
Super 8 ao lado do seu iluminador, arrastando metros e mais metros de fio.
Nessa igreja havia uma particularidade. Os padrinhos colocavam-se nas laterais do altar
, mas o padre se posicionava de costas para o público, ficando os noivos de
frente para os convidados. Normalmente, os noivos ficam de costas.
Estava tudo pronto para o inicio da cerimônia. Imagine: as portas da igreja se abrem, surge
a noiva, linda como sempre (eu acho todas as noivas lindas!). Um som maravilhoso invade a igreja. Era a música “Feelings”, com Morris Albert, o
hit da época.
A noiva caminha pelo corredor central da igreja,
distribuindo sorrisos e simpatia a todos os convidados.
De repente, ouve-se um forte estrondo, seguido de um
silêncio sepulcral.
A
noiva, assustada, não entendia o que estava acontecendo. A música parou de tocar. Ficaram todos olhando uns para os outros,
procurando uma resposta para aquela situação inusitada.
A noiva ficou parada no corredor, no meio do percurso
até o altar, aguardando o retorno da música, o que não aconteceu.
Diante
da situação constrangedora, ela foi aconselhada a concluir a sua entrada sem
música mesmo. Assim foi. Muito esquisito. Chegou até o altar, sem
música, no mais completo silêncio. Só se
ouvia os murmúrios dos convidados
Os noivos posicionaram-se no altar, orientados pelo
fotógrafo e ficaram aguardando a presença do padre que, até aquele momento, não
havia adentrado o recinto.
Minutos se passaram e nada de padre...!
De repente, o japonês cinegrafista resolveu fazer uma
“tomada” do altar completo com os noivos e os padrinhos. Para isso, ele subiu em cima do primeiro
banco da igreja. Eram quatro bancos na primeira fila, lado a lado, todos
desocupados.
O
seu auxiliar subiu no banco ao lado para iluminar melhor a cena.
Vendo aquilo, o Euclydes fotógrafo subiu no terceiro
banco para fotografar de um ângulo melhor e, para não ser diferente, subi no
quarto banco. Exatamente no momento que
o padre adentrava ao altar.
Carrancudo, empunhou o microfone e disse alguma coisa
assim: - Na hora que terminar essa palhaçada, essa macaquice, eu volto para
realizar o casamento!...E retornou para a sacristia.
Os quatro, fotógrafo, cinegrafista e respectivos
auxiliares, descemos do banco e nos colocamos ao lado do altar, esperando a
volta do padre, com as caras mais “sem graça” do mundo. Lembro-me que a mãe da noiva começou a passar
mal. Correram para providenciar uma cadeira e um copo d’água para acalmá-la.
Mais alguns minutos depois, o padre voltou. Começou a cerimônia, passando um sabão em
todos, desde os fotógrafos até as famílias ali presentes. Dentre outras coisas,
ele disse que a casa de Deus era um lugar de respeito e não um palco para
palhaçadas.
E iniciou o casamento.
Daí em diante, aparentemente, tudo correu
normalmente. Com o detalhe da mãe da
noiva, que passou a cerimônia toda sentada, sendo abanada por uma
madrinha. O constrangimento era
notório. Todos assistiram à cerimônia na
maior tensão, imaginando que a qualquer momento, o padre poderia ter outro
chilique.
Terminado o casamento, do lado de fora da igreja, o
comentário não poderia ser outro. Estavam todos boquiabertos com o acontecido.
Então, as notícias começaram a chegar e tudo ficou explicado.
O estrondo, seguido da ausência da música durante a
entrada da noiva, deu-se pelo seguinte: quando o padre se dirigia da sacristia
para o altar, ele ouviu a música “Feelings” e não gostou. Achou inadequada para aquele momento. Foi então que percebeu num canto da sacristia
um aparelho de som TRÊS EM UM da Sharp.
Era novidade na época. Um aparelho
desses custava caríssimo e aquele pertencia à família da noiva.
Contrariado, o sacerdote deu um pontapé no aparelho
de som, jogando-o ao chão. Ficou em cacos...
No final da cerimônia, quando a família inteirou-se
do que realmente havia acontecido, o caldo entornou. Algumas pessoas queriam
agredir o padre, mas foram impedidos pelos mais moderados.
Fiquei sabendo que, em seguida, a família foi até a
Delegacia de Polícia local e registrou o fato num Boletim de Ocorrências.
Na segunda-feira, o ocorrido no casamento foi assunto
de debate num programa de rádio, que tratava de assuntos policiais.
Durante muito tempo, não se falava em outra coisa na
cidade e região.
O padre foi afastado da igreja e transferido para
outra cidade.
Por isso, sempre que ouço “Feelings”, recordo-me dessa
passagem.
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Clique no link abaixo, e ouça a música "Feelings", interpretada pelo seu criador, o brasileiro Morris Albert
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